"Se pensas que és pequeno para fazer a diferença... tenta dormir num quarto fechado com um mosquito."
Provérbio africano, no editorial da revista "Recicla"

6.9.08

Compadrio político mata competitividade empresarial


Que o compadrio político é um cancro nas economias é algo empiricamente constatável. E frequentemente noticiado. Mas falta avaliar o seu impacto na gestão e na própria criação de riqueza. Parte dessa lacuna foi, agora, preenchida por uma investigação académica dirigida pelos professores Raj Desai e Anders Olofsgard para o Brookings Institution norte-americano.

A conclusão é arrasadora: o compadrio político é antieconómico. O estudo, intitulado ‘Do politically connected firms undermine their own competitiveness?’, demonstra com base num inquérito, entre 2000 e 2005, a um universo de 10 mil empresas em 40 países, na maioria do chamado mundo em desenvolvimento, que o compadrio político é prejudicial à economia, pois “fomenta a ineficiência, desincentiva a inovação, torna mais míope o planeamento, corrompe a competitividade e distorce a concorrência nos mercados”.


Relação cinzenta

Raj Desai sublinhou-nos que o perfil deste cancro é extensível além do chamado Terceiro Mundo: “Muitos países que são democráticos e mais desenvolvidos do que a maioria da nossa amostra sofrem deste mal. A relação entre democracia e compadrio é cinzenta”. Particularmente agravada em países onde a sociedade civil é fraca, a separação e equilíbrio de poderes é insuficiente ou recente, a justiça é débil, o «lobbying» não é transparente e os grandes grupos económicos e financeiros possuem redes informais de quadros que entram e saem da política, conseguindo um poder de influência desproporcionado. Estas redes de talentos são mais sofisticadas do que as típicas redes familiares e corporativas (por exemplo, altos quadros militares) dos países onde dominam cleptocracias e ditaduras. O estudo refere mesmo que “nos países da OCDE, as firmas com ligações políticas frequentemente representam posições significativas de capitalização de mercado”.


Captura do Estado

A literatura económica popularizou o termo de “captura do Estado” por estes mecanismos de obtenção de favores com valor económico (atribuição de monopólio, tolerância aos cartéis, restrições de mercado a concorrentes, açambarcamento de concursos públicos, subsídios e créditos publicamente garantidos legislados “por medida”, isenções “cirúrgicas”). Os beneficiários deixam o Estado refém de interesses particulares - quer dos políticos como dos empresários ou banqueiros - para obterem rendas ilegítimas actuais ou futuras.

No caso dos políticos de carreira, os benefícios traduzem-se em financiamentos políticos ou favores aos próximos (por exemplo, criação de emprego artificial) e quanto aos que optam pela “mobilidade” entre a cadeira política (que pode ser ministerial, parlamentar ou em agencias de regulação e fiscalização) e o lugar privado beneficiam, em regra, de consultoria, advocacia de negócios ou mesmo lugares cimeiros de administração passado algum tempo.

Raj Desai distingue o compadrio («cronyism», em inglês) da corrupção dos agentes públicos.

in EXPRESSO, Texto de Jorge Nascimento Rodrigues com Ilustração de Paulo Buchinho

Sem comentários: