"Se pensas que és pequeno para fazer a diferença... tenta dormir num quarto fechado com um mosquito."
Provérbio africano, no editorial da revista "Recicla"

5.4.11

Você também tem culpa, caro leitor

Desculpe dizer-lhe isto assim, mas não estamos em época de salamaleques: você, caro leitor, tem culpa do buraco em que o país se afundou.

Claro que não tem tanta culpa quanto os primeiros-ministros que nos últimos 15 anos passearam por Belém, nem quanto as centenas de ministros e secretários de Estado que aceitaram bovinamente os infindos dislates que nos trouxeram até à banca rota. Esses, os chamados "políticos", pecaram por acção. Mas você, eu, todos nós, pecámos por omissão: porque vivendo em democracia, tendo nas nossas mãos o poder de dizer quem manda em Portugal, fomos aceitando um verdadeiro cortejo de mediocridades até chegarmos ao engenheiro Sócrates.

Nós, todos nós, falhámos enquanto sociedade. Não se trata aqui de diluir as culpas num todo abstracto, até chegarmos àquele ponto em que sendo todos culpados ninguém o é verdadeiramente. Trata--se de assumir o dever urgente de repensar o que significa ser um cidadão no Portugal do século XXI.

Com o avanço da democracia e a melhoria das condições de vida, a política tornou-se uma actividade distante. Mas da mesma forma que não é admissível ser-se "apolítico" durante uma ditadura, também agora, nesta encruzilhada da nossa história, ser-se "apolítico" não é uma opção moralmente aceitável. Neste momento, os portugueses parecem-se com aquelas pessoas que já tiveram tantas relações falhadas na vida que deixaram de acreditar no amor. Só que quem deixa de acreditar no amor tem sempre a hipótese de ficar a viver sozinho – e Portugal não tem hipótese de ficar sem governo. Cruzar os braços e suspirar "eles são todos iguais" pode ter sido uma opção durante duas décadas. Não é mais. A política tem de voltar a ser discutida na rua, nos cafés, ao jantar. Nós chegámos à bancarrota porque cometemos o pior dos erros: deixámos a política nas mãos dos políticos.

in Correio da Manhã, João Miguel Tavares

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