"Se pensas que és pequeno para fazer a diferença... tenta dormir num quarto fechado com um mosquito."
Provérbio africano, no editorial da revista "Recicla"

31.3.08

Abordagem Sociológica do Poder Local

A política não se restringe ao acto de denominação pelas elites e à resistência por parte dos cidadãos. Em sociedades municipais é crucial estudar a capacidade de liderança e o papel da burocracia na produção de políticas sociais e ainda de grupos e associações de interesses locais (Gerry Stoker, 1995).

No nosso trabalho chama-se igualmente a atenção para a existência em Portugal de um certo caudilhismo político local que sem atingir a importância do fenómeno do Mayor Daley em Chicago nos anos cinquenta e sessenta, merece especial atenção.

Este fenómeno manifesta-se no facto da permanência do mesmo presidente camarário, independentemente da sorte das eleições nacionais, tendo várias explicações.

Em alguns casos está associado a habilidade em solucionar situações de ruptura, garantindo consensos e objectivos comuns que possam pelo crescimento urbano e valorização dos interesses locais. Noutros casos, este fenómeno não se pode desligar do controlo da construção urbana e da localização industrial e, por consequência, também do emprego. Constituem características comuns às duas situações e domínio do aparelho administrativo e a existência de clientelismo.

Todavia, o trabalho mais importante deve-se a Opello (1983) o qual examina o governo local e a cultura política de um concelho rural no período a seguir ao 25 de Abril de 1974. Da sua análise ressalta a ideia de que apesar da burocratização do sistema político e da autonomia dos governos locais, estes continuam amarrados à tutela administrativa e completamente dependentes sob o ponto de vista financeiro; daí que o processo de decisão seja predominantemente administrativo.

Acresce que a cultura política local também não se alterou. Cidadãos e dirigentes locais têm um comportamento de administrados/administradores. Não existe a cultura de responsabilidade destes últimos relativamente às assembleias municipais e, por intermédio destas, aos cidadãos.

(...)

No contributo destes autores é de sublinhar sobretudo a chamada de atenção para a informalidade das relações entre os eleitos locais e o poder central de Estado. Na verdade, o quadro formal das competências locais pouco nos diz sobre o relacionamento entre os poderes do Estado.

Cada local tem uma cultura política própria com maior ou menor poder negocial relativamente ao poder central.

A propósito das relações entre o poder central e poder local, Fernando Ruivo fala de um Estado labiríntico em que as relações pessoais se sobrepõem ao quadro jurídico. Isto significa que a abordagem jurídica formal espelha um mundo imaginário que na realidade não existe

(...)
Assim, depois de caracterizarem o perfil do autarca, de examinarem o contexto jurídico e as restrições financeiras à Administração local, procuram definir o papel das câmaras no desenvolvimento local, pela análise dos orçamentos verificam que em meados da década de oitenta mais de 75% do total dos investimentos eram gastos em rede viária, saneamento básico e exploração dos serviços tradicionais - fornecimento de água, transportes, recolha de lixo, etc. E, embora tivessem sido alargadas as suas competências a determinadas áreas de intervenção económica como a saúde e o turismo, pouca influência haviam tido nestes sectores.

Áreas como a criação de empregos, formação profissional e incentivos à fixação de empresas eram quase desconhecidas da gestão local.

Em termos de processo decisão, predominavam os mecanismos jurídico-constitucionais e de rotina.
(...)

in Regionalização

29.3.08

Covilhã vai fabricar aviões


A cidade da Covilhã vai ser palco de um investimento luso-francês no sector da indústria aeronáutica, em associação com a Universidade da Beira Interior e com a própria autarquia.

A ALEIA - Indústria Aeronáutica de Portugal, que tem como accionistas as indústrias francesas Dyn’Aéro e Equip’Aéro, para além das empresas portuguesas Spinworks (aeroespacial) e Plasdan (área dos moldes), vai instalar-se nas imediações do aeródromo da cidade, onde criará uma linha de montagem de aeronaves de dois e quatro lugares.

Fabricará peças para aviões de um construtor francês ligado ao projecto e, em simultâneo, desenvolverá uma gama própria de aviões certificados, com uma forte componente de tecnologia de última geração, baseados num motor desenvolvido desde 2002 pela empresa francesa Price-Induction.

O motor que irá equipar esta gama de aeronaves venceu o Prémio Inovação, atribuído pela Association des Ingenieurs Aéronautiques Français (AAAF), no ano de 2007.

Os responsáveis pela ALEIA, que assinarão o contrato de investimento com a autarquia no próximo dia 14 de Abril, querem iniciar as obras da fábrica de imediato, para começarem a entregar as primeiras aeronaves «made in Covilhã» no Verão de 2009. Quando a empresa atingir a velocidade cruzeiro em termos de produção, o que se espera poder acontecer em 2014, prevê colocar no mercado 250 unidades de três modelos diferentes por ano.

Mas há ainda uma novidade adicional: a ALEIA quer colocar a voar no primeiro semestre de 2010 os primeiros dois protótipos de aviões totalmente concebidos e fabricados na Covilhã, em estreita colaboração com a UBI, onde existe um dos poucos cursos de engenharia aeronáutica em Portugal.

Os responsáveis pelo projecto estimam que nos próximos três anos a empresa possa criar pelo menos 100 postos de trabalho qualificados, nomeadamente para engenheiros e técnicos especializados.


O «clic» que faltava

“Este era o «clic» que esperávamos há anos para que a cidade e a região pudesse descolar, de uma vez por todas, para novos voos em termos de crescimento económico e social. Finalmente conseguimos, e estão criadas as condições para aqui nascer um pequeno «cluster» aeronáutico, em associação com o Parque Tecnológico da Covilhã, onde já estão instaladas 30 empresas inovadoras”, sublinha Carlos Pinto, presidente da Câmara Municipal da Covilhã (CMC).

Ainda nesta cidade será formalizada no dia 1 de Abril a criação do Centro Operativo de Novas Tecnologias da Covilhã.

As multinacionais Teleperformance e Vodafone serão as primeiras inquilinas desta infra-estrutura, com a abertura de um «contact center» (centro de contacto telefónico), que deverá gerar, numa primeira fase, 300 postos de trabalho. No entanto, e ainda segundo Carlos Pinto, calcula-se que se possa chegar aos 500 postos de trabalho até 2010.


A aposta nos serviços

“Isto é, sem dúvida, uma boa notícia para a cidade e para a região. Mas este investimento é também a prova de que começamos a ganhar algum relevo em termos de atracção de empresas do sector terciário, que encontram aqui os recursos de que precisam para os seus negócios”, refere o autarca.

Numa nota à comunicação social, a CMC adianta ainda que “a Vodafone utilizará este centro para responder a novas necessidades do seu serviço de apoio a clientes”. Aliás - adianta o mesmo comunicado -, estima-se que até final deste ano a estrutura a criar na Covilhã processe cerca de 10% do volume de atendimento deste serviço.

O «contact center», cuja abertura está prevista para Outubro de 2008, contará com a mais sofisticada tecnologia IP (Protocolo Internet) da Vodafone para prestar serviços de atendimento telefónico, de correio electrónico e de «chat» aos clientes desta operadora.

in Expresso, Vítor Andrade

19.3.08

Salário 72% superior nas tecnologias de informação

O sector das tecnologias de informação é o que melhor remunera os recém-licenciados, sendo que, em 2008, as diferenças entre sectores, só no que diz respeito ao salário de base, chegam a alcançar os 72%, revela um estudo da Sales Hunter a que o Destak teve acesso.


No entanto, a disparidade pode ainda ser superior quando adicionada a parte variável da remuneração e os benefícios sociais que muitas áreas de actividade aportam.

Em média, aos recém-licenciados contratados é atribuída uma remuneração de base mínima de 27 mil euros, além de vários benefícios sociais, entre os quais seguros médicos e vales de refeição. No caso dos perfis comerciais, é também disponibilizado um veículo da empresa.

Às tecnologias de informação segue-se a construção e indústria, com salários base médios de 25 200 euros. O farmacêutico ocupa o terceiro lugar, com um ordenado médio de 21 600 euros.

Plano tecnológico reforçado

O primeiro-ministro anunciou ontem um investimento «sem precedentes» para as escolas no plano tecnológico. José Sócrates - que falava no Convento do Beato, na cerimónia de assinatura de acordos entre o Governo e 30 empresas de tecnologias de informação e comunicação para a abertura de 300 estágios ao nível do ensino profissionalizante - ressalvou que a política educativa dos últimos dois anos tem invertido o insucesso nas escolas.

No entanto, o presidente da Associação das Pequenas e Médias Empresas já veio criticar este anúncio do Governo, referindo que a assinatura de protocolos só serve para «engordar» as grandes empresas que estão cá para «receber subsídios».

in Destak, Patrícia Susano Ferreira | pferreira@destak.pt

13.3.08

Fundos de desenvolvimento urbano criados em Junho

O Governo vai criar uma parceria público e privada para as cidades. Nos próximos três meses o executivo compromete-se a aplicar em Portugal os fundos de desenvolvimento urbano atribuídos pela União Europeia.

O secretário de Estado do Ordenamento do Território revelou esta quarta-feira que é necessário definir a composição, o financiamento e o âmbito geográfico destes fundos, que já tem um enquadramento europeu.

Os fundos de desenvolvimento urbano vão ser compostos por capital privado e capital público. Desde logo, do lado público, vai ser mobilizado parte do FEDER (Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional).

O secretário de Estado do Ordenamento do Território, João Ferrão avisa, no entanto que do ponto de vista fiscal e financeiro, esta é uma operação complexa mas que pode dar resposta à necessidade de diversificação das fontes de financiamento.

«Acreditamos que a constituição destes fundos de desenvolvimento urbano - cujos moldes ainda vamos estudar - pode ser muito favorável para o financiamento sustentável da reabilitação urbana em Portugal» explica o secretário de Estado.

Mas para já ainda não está definido o modelo a seguir, explica João Ferrão, já que o Estado tem «liberdade de encaminhar esses fundos ou para um município, ou para um conjunto de municípios ou mesmo para uma região».

A experiência dos outros países que já adoptaram os fundos de desenvolvimento urbano vão desde a aplicação destes fundos a grandes cidades. Mas há quem os desenvolva numa escala regional.

É isso que Portugal tem agora que definir a fim de passar para a legislação nacional acções que a Europa já contempla e para as quais o Banco Europeu de Investimento já disponibiliza financiamento.

in TSF

4.3.08

Cooperação: Salamanca e municípios portugueses vão criar agrupamento territorial


Salamanca, Espanha, 03 Mar (Lusa) - Nove municípios do centro de Portugal e a Deputação de Salamanca (Espanha) assinaram hoje nesta cidade espanhola uma declaração para a criação de um Agrupamento Europeu de Cooperação Territorial.
Fontes regionais em Salamanca explicam que o acordo envolve ainda a associação de municípios de Cova da Beira e a Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro.

Isabel Jiménez, da Deputação de Salamanca e que liderará o grupo de trabalho conjunto durante o próximo ano, explicou na reunião de hoje que o objectivo é "apostar no futuro desta zona transfronteiriça" apesar da "perda de financiamento" europeu.

É crucial, referiu, "trabalhar juntos, sem projectos individuais e de forma generosa para conseguir iniciativas que tragam resultados óptimos para o desenvolvimento socioeconómico" dos dois lados da fronteira.

Júlio Sarmento, presidente da Câmara Municipal de Trancoso, manifestou no encontro "total confiança no trabalho conjunto, perante a UE, dos municípios portugueses e espanhóis".

Nesse sentido destacou a necessidade de "manter a confiança mútua nestes momentos difíceis e de grande concorrência pelas ajudas europeias".

Para Júlio Sarmento, o novo agrupamento trás "uma nova dimensão ao futuro do trabalho" que será desenvolvido na zona, podendo aceder directamente a fundos e programas europeus.

Responsáveis de ambos os países vão agora consolidar três projectos que a Comunidade de Trabalho Salamanca-Beira Interior Norte vai apresentar depois ao novo programa de Cooperação Transfronteiriça 2007-2013.

Um dos projectos envolve a criação de um Observatório Transfronteiriço do Desenvolvimento Territorial em que estarão implicadas as administrações públicas, diversas instituições e entidades universitárias e empresariais dos dois países.

Igualmente prevista está a constituição da sede do Agrupamento Europeu que sirva como receptor e fonte de informação para dinamizar, modernizar e diversificar o sector turístico e empresarial de Salamanca e da Beira Interior Norte.

Por último apresentará ainda um outro projecto relacionado com o estabelecimento de uma rede que consolide os sistemas transfronteiriços de prevenção de riscos naturais, garantindo uma resposta coordenada.

Além dos representes de Salamanca e do autarca de Trancoso participaram no encontro de hoje representantes dos municípios de Almeida, Celorico Da Beira, Figueira de Castelo Rodrigo, Guarda, Manteigas, Meda, Pinhel, e Sabugal, e coordenadores do Centro de Desenvolvimento Regional Centro, da Associação de Municípios de Cova da Beira e do Serviço Nacional de Protecção Civil.

in RTP

2.3.08

Portugal, Um Retrato Social

A RTP produziu a série Portugal, Um Retrato Social, cujo teor é, na minha opinião, o melhor que se fez em Portugal no periodo democrático.

Aqui fica o link da referida série no google video.

16.2.08

Presidente diz que a autarquia reduziu o endividamento global «em 20 por cento» em 2007

A Câmara de Trancoso já liquidou o excesso de endividamento líquido apurado em 2006, após a retenção de cerca de 50 mil euros do duodécimo do Fundo de Equilíbrio Financeiro (FEF) a que tinha direito nos meses de Dezembro e Janeiro. «Isso não teve qualquer impacto ou consequência na actividade do município, até porque se trata de uma fatia muito pequena se atendermos aos quase 800 mil euros/mês que recebemos do Estado», sublinha Júlio Sarmento.
No final do ano transacto, a autarquia integrou a lista de 22 Câmaras que ultrapassaram os limites de endividamento. No caso de Trancoso, o Governo contabilizou mais de 96 mil euros, um valor corrigido depois do Ministério das Finanças ter apurado inicialmente 425 mil euros. Mesmo assim, a edilidade interpôs uma providência cautelar para esclarecer as contas e a decisão governamental. «Ainda continuamos à espera de uma resposta do Supremo Tribunal Administrativo, ao qual recorremos não pelo montante em causa – que é baixo – mas sim para clarificar o assunto», refere o autarca. «Sem diferenciar a situação específica de cada caso, as notícias difundidas induzem a erradas e infundadas interpretações que pretendemos esclarecer», acrescentou na altura.
Entretanto, segundo Júlio Sarmento, a autarquia conseguiu reduzir o endividamento global «em 20 por cento» no exercício de 2007. O que, de acordo com a lei, garante que «50 por cento da verba retida ser-nos-á ressarcida ainda este ano e o restante no próximo», adianta o autarca. No distrito, a Guarda (1,4 milhões) e Fornos de Algodres (três milhões) são outros municípios afectados. No primeiro caso a Câmara receberá menos 90.699 por mês até que seja recuperado o valor de endividamento excessivo. Já a autarquia de Fornos será privada, mensalmente, de 31.238 euros. Segundo a legislação, se o município eliminar o excesso de endividamento líquido nos três anos subsequentes ao que determinou a redução, será devolvida a totalidade da verba, cessando também a redução. Os montantes retidos às 22 Câmaras incumpridoras têm suprido o Fundo de Regularização Municipal, que conta actualmente com mais de 2,5 milhões de euros.
O secretário de Estado Adjunto da Administração Local, Eduardo Cabrita, revelou esta semana que, se ao fim de três anos, não se verificarem as condições para devolver os montantes aos municípios, os fundos existentes e respectivos juros são afectos ao FEF e servirão para reforçar as dotações dos municípios mais pobres. Isto é, aqueles que tenham uma capitação de impostos locais inferior a 1,25 por cento de média nacional e que estejam a cumprir os objectivos de um plano de saneamento ou reequilíbrio financeiro. Os recursos retidos podem ainda ser valorizados através da sua aplicação em Certificados Especiais de Dívida de Curto Prazo (CEDIC) ou outro instrumento financeiro equivalente de aplicação de saldos de entidades sujeitas ao princípio da Unidade de Tesouraria.

10.2.08

Evolução


A Câmara Muncipal e a Assembleia Municipal de Óbidos decidiram rever o Plano Director Municipal com o propósito de reduzir os índices de construção de empreendimentos turisticos no território daquele município, objecto de um surto de procura de investidores pela excelência da sua costa.
É um sinal muito importante, que importa registar pelo que tem de inédito mas sobretudo pela inteligência que revela o jovem e dinâmico presidente do executivo camarário, Telmo Faria.
Justificando a medida, Telmo Faria disse esta coisa simples mas pouco habitual de se ouvir: «face à procura muito elevada [para a construção de empreendimentos turísticos] percebemos que se aprovássemos tudo íamos dar cabo disto».
O "tudo" a que o presidente da Câmara se referia eram as 39 mil camas turísticas previstas no PDM que agora nessa parte ficará suspenso, a grande maioria delas a instalar ao longo do litoral do concelho.
Percebeu-se ali que a valorização dos territórios não se faz pela massificação da sua ocupação. Não se cria riqueza, sustentavelmente, só porque se constrói muito. Bem pelo contrário. A prazo, a perda de qualidade dos espaços pelo excesso de edificação, a pressão sobre os recursos e a insuficiência e mau dimensionamento das infra-estruturas, acaba com a ilusão.
Esta percepção não é coisa pouca num País pouco cuidadoso com o ordenamento do seu reduzido território.
Oxalá que a atitude tenha efeitos contaminatórios.
Por isso se regista e saúda aqui a clarividência de Telmo Faria.

in Quarta República, JM Ferreira de Almeida

7.2.08

Análise crítica do Plano de Desenvolvimento Estratégico da Comunidade Urbana das Beiras

Citando o sumário executivo do documento, o Plano de Desenvolvimento Estratégico da Comurbeiras (doravante designado por PDECUB) "valoriza as iniciativas de carácter supra-municipal que se revestem de uma natureza estruturante e que confinam o desenho e implementação de uma estratégia comum de desenvolvimento sustentável para o território das Beiras". É ambição do PDECUB dotar os responsáveis da administração local que integram a Comurbeiras de "uma Estratégia consistente para enfrentar os desafios do desenvolvimento que se colocam a esta região". Debrucemo-nos um pouco sobre essa consistência e sobre a sua natureza intermunicipal…
O PDECUB apresenta um diagnóstico estratégico da área territorial da Comunidade Urbana, identificando os eixos e apostas estratégicas que estão na base dos projectos a desenvolver no período 2007-2013. O diagnóstico revela-se algo optimista, mas admite-se que só com algum optimismo é possível encarar qualquer futuro promissor para este território da Beira Interior.
Da análise SWOT realizada no âmbito do PDECUB, decorreram 5 eixos de desenvolvimento: Eixo I - Património Histórico, Turismo e Ambiente; Eixo II - Produtos do Território; Eixo III - Posicionamento Transfronteiriço; Eixo IV - Inovação e Competitividade e, finalmente, o Eixo V - Coesão Social e Territorial. Estes eixos subdividem-se em 22 apostas estratégias que se materializam em 552 projectos (segundo o plano, de âmbito nacional e transnacional).
Relativamente a estes projectos são introduzidos níveis de prioridade: Estruturantes (***), de Suporte (**) e de Interesse Concelhio(*), respectivamente dos que têm mais impacto para o atingir dos objectivos do Plano aos se reflectem apenas no desenvolvimento de uma área territorial mais restrita, apesar de serem os que melhor contribuem para a coesão social do território COMUM. Mas será que a aparente coerência da estratégia do plano se reflecte na sua proposta de execução?
Atentemos então, na forma de financiamento dos projectos que o PDECUB propõe, em particular dos projectos de natureza estruturante, admitindo que serão estes os que, dentro das cinco centenas e meia, possuem maior possibilidade de virem a concretizar-se.
O gráfico 1 mostra como os eixos I e V absorvem cerca de 71% do total. Não obstante, enquanto no eixo I apenas cerca de 32% do financiamento é público, já no eixo V este valor corresponde a 96%, o que demonstra claramente como o investimento privado é alheio à importância da coesão social e territorial da Comunidade, preferindo claramente a aposta no eixo I que se reflecte em cerca de 80% de todo o investimento privado referenciado no PDECUB, em particular na área do Turismo.
Olhando agora apenas para os projectos estruturantes (gráficos 2 e 3), veja-se como o financiamento público beneficia claramente o eixo I (em particular a "Aposta nos activos históricos medievais do Côa; das Descobertas e dos activos patrimoniais por segmento" e a "Aposta na requalificação da Serra da Estrela") que absorve cerca de 43% do total do financiamento público estruturante, e onde Manteigas aparece, em ambos os casos, como o concelho que recolhe maior financiamento. Curioso será também referir que a "Aposta da interligação dos activos turísticos", talvez uma das mais importantes na criação de produtos turísticos mais competitivos nacionalmente, recolhe a menor quantidade de financiamento do eixo I.
Já no que respeita ao eixo V, este recolhe apenas cerca de 4% do financiamento público estruturante, o que refuta claramente a mensagem passada pelos dados genéricos do gráfico1, verificando-se que é no financiamento considerado menos prioritário que o eixo representativo da Coesão Social e Territorial recolhe o financiamento público ou seja, provavelmente nunca recolherá financiamento algum (gráfico 4). Também o eixo II – Produtos do Território, é preterido no que respeita a projectos estruturantes, tanto no que respeita ao financiamento público (cerca de 5%) como ao privado (cerca de 7,5%). O investimento privado em projectos estruturantes vira-se claramente para o eixo I, que recolhe cerca de 83,5% do mesmo, indo de encontro aos dados genéricos anteriormente apresentados, claramente influenciado pela aposta do sector privado na Serra da Estrela (marca âncora do Turismo da Região, conforme dita o PETUR).
O Plano refere que "A competitividade das unidades territoriais constituintes da Comurbeiras assenta nas Forças decorrentes da sua localização geográfica face à envolvente contextual ibérica e, sobretudo nos seus recursos naturais e paisagísticos". Mas, no que respeita ao eixo III - Posicionamento Transfronteiriço, que decorre directamente deste princípio, apesar do financiamento público em projectos estruturantes representar cerca de 24% do total, dirige-se quase na totalidade para a "Aposta no desenvolvimento do eixo logístico ibérico" ignorando a segunda vertente do eixo, a "Aposta na colaboração raiana e no desenvolvimento transfronteiriço" e, consequentemente, preterindo as regiões mais desfavorecidas do território da Comunidade. Em relação a este eixo, o investimento privado é nulo, o que reflecte também que a falta de maturidade das relações transfronteiriças, que este plano não pretende de todo reforçar, as alheia do sector privado, colocando em causa o próprio estabelecimento de um eixo logístico ibérico, na medida em que o mesmo depende intrinsecamente deste sector.
No que respeita ao eixo IV – Inovação e competitividade, o financiamento privado corresponde apenas a 9% enquanto os 91% do financiamento público se dirigem, sobretudo, para projectos estruturantes nas apostas nos "clusters emergentes" e numa "estratégia para a potenciação da especialização histórica", correspondendo a cerca de 24% do total deste tipo de investimento sendo que, nestas apostas em particular, os maiores beneficiários são os concelhos de Manteigas e Covilhã.
Mas voltemos a uma análise global do plano admitindo, juntamente com os projectos de natureza estruturante, a importância dos projectos de suporte e de interesse concelhio. Analisando a distribuição do financiamento público e privado por concelho (gráfico 5) verifica-se que, na globalidade, a grande fatia se destina, por ordem decrescente, aos concelhos da Covilhã, Fundão, Manteigas, Pinhel e Guarda.
A análise por eixos (gráficos 6 a 10), mostra-nos que, como principais concelhos beneficiários da totalidade do financiamento aparecem, por ordem decrescente, no eixo I: Manteigas>Fundão>Covilhã no eixo II: Fundão>Pinhel> Almeida, no eixo III: Fundão>Covilhã> Sabugal, no eixo IV: Covilhã>Fundão> Celorico da Beira e finalmente, no eixo V: Pinhel>Covilhã>Guarda. Não será necessário tecer comentários sobre a concentração do financiamento na Cova da Beira em detrimento da restante área territorial COMUM.
Contudo, importa reforçar que nem todos os projectos aparecem com referência ao investimento de que carecem para a sua execução. Curiosamente são sobretudo os "projectos materiais" que aparecem com valores concretos sendo que, no caso dos "imateriais", na grande maioria dos casos não é estimado qualquer valor. No caso particular dos projectos a desenvolver pela Comurbeiras, (onde se verifica o maior n.º de projectos estruturantes distribuídos pelos vários eixos – (gráfico 11), não há qualquer indicação de valores, razão pela qual, não são contabilizados para o tão conhecido bilião de euros (996 386 581,47 €) que é apresentado como orçamento do Plano e que representa quase 60 % do financiamento destinado a toda a Região Centro. Tendo em conta que o território da Comurbeiras representa cerca de 20% de toda a Região Centro e que possui uma densidade populacional de cerca de 36 hab/km2 para os cerca de 84 hab/km2 dessa mesma região, o cenário de concretização do plano revela-se, no mínimo, inconsistente.
O facto dos projectos que apresentam orçamento serem sobretudo de carácter "material" reflecte, mais uma vez, a inexperiência dos autarcas em lidar com tudo o que não implica obra feita. Lidam mal com projectos sem visibilidade física, mais dependentes do conhecimento, da criatividade e capacidade de inovar, argumentos indispensáveis para uma estratégia sustentada para uma região de poucos recursos financeiros. Reflecte também, à semelhança do que acontece com a administração central na relação de forças entre as grandes áreas metropolitanas e as regiões menos desenvolvidas, que o investimento se concentra sobretudo nas zonas de concentração de poder, sem contribuir para o reforço das especificidades de cada concelho enquanto base da complementaridade entre eles.
Mas voltemos agora aos projectos estruturantes, analisados em função da quantidade atribuída a cada concelho, uma vez que, como já foi referido, uma grande parte dos projectos não têm afectada qualquer verba, pelo que não contribuem para a análise anteriormente feita relativamente ao financiamento do Plano. Verifiquemos, então, se a direcção das prioridades caminha para os mesmos locais.
Analisando na globalidade (gráfico 11) verifica-se que, abaixo da Comurbeiras, são novamente os concelhos da Covilhã, Fundão e Manteigas a obter os primeiros lugares no ranking. Curioso é também lembrar que o concelho do Fundão, um dos discricionários beneficiantes do PDECUB, ainda não formalizou a adesão à Comurbeiras… imagine-se se já tivesse formalizado!
A análise por eixos (gráficos 12 a 16), mostra-nos que, como principais concelhos beneficiários de projectos estruturantes aparecem, por ordem decrescente, no eixo I: Manteigas>Fundão>Covilhã, no eixo II: Comurbeiras> Fundão, no eixo III: Comurbeiras>Almeida>Fundão>Trancoso, no eixo IV: Comurbeiras>Covilhã>Pinhel e finalmente, no eixo V: Comurbeiras>Manteigas. Relativamente aos concelhos mais beneficiados, verifica-se que a estratégia do Plano não é significativamente alterada por esta análise.
Não obstante, é relevante o facto da Comurbeiras assumir a liderança em quatro dos cinco eixos de desenvolvimento, onde concorre com os chamados "projectos imateriais", que mobilizam pessoas e conhecimento, criam conexões de interesses e partilha de objectivos. Tal reflecte o facto do valor que veio a público, de cerca de 1 bilião de euros, para concretização deste plano, estar longe de permitir que se efective no terreno uma estratégia de âmbito regional para este território COMUM, o que transforma este Plano num gigante sofisma, completamente inexequível.
Esta análise não teve como objectivo debruçar-se sobre a lógica de prioridade dada a cada projecto em particular. Contudo, pode acrescentar-se que foram encontradas lógicas absolutamente distintas em projectos de natureza semelhante, em função do concelho a que esses projectos pertencem. Por outro lado, não pode dizer-se que o número de projectos estruturantes afectos a cada concelho esteja relacionado com a importância que os mesmo detêm no impacto da concretização dos objectivos do plano…A não ser que estejamos a falar de "objectivos de entrelinhas" que ultrapassam qualquer análise desta natureza.
Este cenário, associado ao facto do presidente da CCDRC ter afirmado que o Quadro de Referência Estratégico Nacional para 2007/2013 poderá ser a "última oportunidade" para desenvolver a Região Centro do país, bem como ao facto de Carlos Pinto, presidente da Comurbeiras e também da Câmara da Covilhã, ter informado que o Estado, baseado na existência deste plano estratégico intermunicipal, vai atribuir à Comunidade Urbana das Beiras um pacote financeiro para executar projectos no âmbito do QREN, é inquietante. Ao que parece vão (não se sabe como) ser seleccionados os projectos que, entre os 552, passarão à versão final. Segundo Carlos Pinto a negociação vai ser feita com a CCDRC. Vai também formar-se uma equipa responsável pela gestão das verbas do QREN.
Destas notícias não fica claro se o que se negoceia são os projectos ou o valor do contrato financeiro. Fica-se também na dúvida se este contrato consubstancia a transferência de competências da administração central para a Comurbeiras em matéria de gestão da totalidade das verbas que o QREN poderá afectar ao território COMUM. Mas o mais preocupante é que os membros da Comurbeiras aprovaram um plano cuja estratégia de execução está completamente desajustada dos recursos disponíveis, que resulta de um somatório de projectos de natureza intermunicipal duvidosa que depois de cedidos pelos municípios, foram baralhados e dados em função de interesses claramente concelhios. E é este o documento que ditará a nossa "última oportunidade"…de falhar enquanto região.

in O Interior, Cláudia Quelhas