"Se pensas que és pequeno para fazer a diferença... tenta dormir num quarto fechado com um mosquito."
Provérbio africano, no editorial da revista "Recicla"

27.9.08

A nova amiga da floresta

É uma propriedade plana de 25 hectares de pinheiro bravo e solos arenosos perto de Grândola, e desde Março que os seus matos - ou combustíveis florestais, como gostam de lhes chamar os especialistas - têm sido limpos de uma forma inovadora, usando um rebanho de 16 cabras controlado por cercas eléctricas.

As cercas são alimentadas por painéis de energia solar e, numa segunda fase, cada animal será também controlado por telemóvel e através de um GPS na coleira, que permitirá a sua localização e identificação por rádio frequência. Um sistema que será, no fundo, uma espécie de cerca virtual: quando a cabra sair de determinada área o GPS envia as respectivas coordenadas e alguém recebe de imediato um aviso no telemóvel.

As cabras são da raça serpentina, típica do sul do país, comem tudo o que encontram à frente - silvas, tojo, urze - e prestam um serviço que custa entre 100 a 200 euros por hectare. É mais caro que um tractor (70 euros por hectare), mas tem vantagens muito compensadoras para o ambiente: não provoca poluição sonora, não implica o consumo de combustíveis fósseis, não emite CO2 para a atmosfera, valoriza a paisagem.

E tem benefícios sociais, porque são criados postos de trabalho para acompanhamento e cuidados de sanidade dos animais, e surgem novas oportunidades em zonas rurais deprimidas.

Mas em terrenos irregulares e pedregosos as vantagens económicas são evidentes. “Neste caso o método do pastoreio dirigido que usamos permite reduzir até 10% os custos normais da limpeza dos matos, porque além das máquinas há trabalho manual, e o custo do serviço pelos métodos clássicos pode chegar aos 2000 euros por hectare em zonas como a Serra de Sintra, onde fizemos a primeira experiência”, explicou ao Expresso Carlos Machado, um dos três promotores (dois engenheiros florestais e um zootécnico) da Caprinus & Companhia.

O projecto recebeu esta semana o Prémio Ideias Verdes - que inclui um troféu, um diploma e uma dotação em dinheiro de 50 mil euros - e foi entregue por Francisco Pinto Balsemão, presidente da Impresa, e Alberto da Ponte, presidente da Água de Luso, numa cerimónia que decorreu na sede do grupo Impresa (proprietário do Expresso), em Paço de Arcos.

“Há pelo menos um milhão de hectares de floresta em todo o país com condições para o pastoreio dirigido com caprinos”, salienta Carlos Machado. Depois dos projectos-piloto da Caprinus & Companhia (uma marca criada pela empresa Silviconsultores) na Serra de Sintra e em Grândola, estão em fase de conclusão as negociações para o primeiro projecto em larga escala, nas Serras de Aires e Candeeiros, no centro do país.

Trata-se de uma área de 700 hectares de floresta pertencente à Junta de Freguesia de Alcobertas (concelho de Rio Maior), onde vão ser necessárias mais de 200 cabras. “O dinheiro do Prémio Ideias Verdes vai ser todo investido neste projecto integrado, que poderá ter um impacto importante no desenvolvimento local, porque envolve uma parceria com a Junta de Freguesia e uma cooperativa leiteira com um efectivo de 2500 caprinos e planos para uma queijaria”, revela Carlos Machado.

in EXPRESSO, Virgílio Azevedo

UM PROJECTO INOVADOR

Biomassa florestal a níveis de baixo perigo de incêndio

Pastoreio dirigido por GPS, telemóvel e cercas eléctricas

Baixo custo

Reduzidas emissões de CO2, ausência de ruído e aumento da fertilidade dos solos

Criação de emprego em áreas rurais deprimidas

6.9.08

Compadrio político mata competitividade empresarial


Que o compadrio político é um cancro nas economias é algo empiricamente constatável. E frequentemente noticiado. Mas falta avaliar o seu impacto na gestão e na própria criação de riqueza. Parte dessa lacuna foi, agora, preenchida por uma investigação académica dirigida pelos professores Raj Desai e Anders Olofsgard para o Brookings Institution norte-americano.

A conclusão é arrasadora: o compadrio político é antieconómico. O estudo, intitulado ‘Do politically connected firms undermine their own competitiveness?’, demonstra com base num inquérito, entre 2000 e 2005, a um universo de 10 mil empresas em 40 países, na maioria do chamado mundo em desenvolvimento, que o compadrio político é prejudicial à economia, pois “fomenta a ineficiência, desincentiva a inovação, torna mais míope o planeamento, corrompe a competitividade e distorce a concorrência nos mercados”.


Relação cinzenta

Raj Desai sublinhou-nos que o perfil deste cancro é extensível além do chamado Terceiro Mundo: “Muitos países que são democráticos e mais desenvolvidos do que a maioria da nossa amostra sofrem deste mal. A relação entre democracia e compadrio é cinzenta”. Particularmente agravada em países onde a sociedade civil é fraca, a separação e equilíbrio de poderes é insuficiente ou recente, a justiça é débil, o «lobbying» não é transparente e os grandes grupos económicos e financeiros possuem redes informais de quadros que entram e saem da política, conseguindo um poder de influência desproporcionado. Estas redes de talentos são mais sofisticadas do que as típicas redes familiares e corporativas (por exemplo, altos quadros militares) dos países onde dominam cleptocracias e ditaduras. O estudo refere mesmo que “nos países da OCDE, as firmas com ligações políticas frequentemente representam posições significativas de capitalização de mercado”.


Captura do Estado

A literatura económica popularizou o termo de “captura do Estado” por estes mecanismos de obtenção de favores com valor económico (atribuição de monopólio, tolerância aos cartéis, restrições de mercado a concorrentes, açambarcamento de concursos públicos, subsídios e créditos publicamente garantidos legislados “por medida”, isenções “cirúrgicas”). Os beneficiários deixam o Estado refém de interesses particulares - quer dos políticos como dos empresários ou banqueiros - para obterem rendas ilegítimas actuais ou futuras.

No caso dos políticos de carreira, os benefícios traduzem-se em financiamentos políticos ou favores aos próximos (por exemplo, criação de emprego artificial) e quanto aos que optam pela “mobilidade” entre a cadeira política (que pode ser ministerial, parlamentar ou em agencias de regulação e fiscalização) e o lugar privado beneficiam, em regra, de consultoria, advocacia de negócios ou mesmo lugares cimeiros de administração passado algum tempo.

Raj Desai distingue o compadrio («cronyism», em inglês) da corrupção dos agentes públicos.

in EXPRESSO, Texto de Jorge Nascimento Rodrigues com Ilustração de Paulo Buchinho