"Se pensas que és pequeno para fazer a diferença... tenta dormir num quarto fechado com um mosquito."
Provérbio africano, no editorial da revista "Recicla"

9.12.07

O caminho do precipício


Portugal é conhecido por se colocar na parte cimeira das listas dos países onde existe mais corrupção. Possivelmente a corrupção em Portugal não é tanto a da compra de grandes favores, mas é sem dúvida a que resulta do pequeno favor, do compadrio, do afilhado, da cunha, da pequena influência. O caciquismo do final da monarquia e do início da República não desapareceu, só se refinou e adaptou às novas realidades.
Nós não abandonámos há tanto tempo como se pensa uma sociedade de servos e senhores. Uma boa parte da população portuguesa continua a manter intactos alguns hábitos da sociedade servil. É isso que explica que muita gente do povo se não sinta bem se não oferecer umas garrafas de tinto, o whisky velho, o cabrito, a perdiz… ao médico que se limitou a tratá-lo com profissionalismo e respeito. As professoras e os professores, sobretudo os do primeiro ciclo a trabalhar em aldeias, conhecem bem esta realidade. Quanta quinquilharia pavorosa não têm os educadores e professores de aceitar com um sorriso de embaraço e simpatia.
Na sociedade portuguesa a corrupção é particularmente pesada na esfera do emprego. Uma boa parte dos portugueses têm empregos adquiridos através do favor, da cunha, do amigo, do familiar, da pequena influência. Estudar a natureza das relações entre os trabalhadores dependentes de uma Câmara Municipal, por exemplo, ajuda a perceber o que somos e o que vai por aí. Somos bombeiros, maqueiros da ambulância, árbitros de futebol ou trabalhamos num centro de saúde porque temos um parente ou um amigalhaço bem colocado no meio.
A direita passa o tempo a pregar a bondade do mercado e a lisura das relações de trabalho no sector privado. Dizem que o mercado é exigente e não contemporiza com os favores. Ou se é bom e singra-se na carreira ou o mercado elimina. Nada de mais errado. Pelo menos em Portugal não se arranja um emprego no sector privado por se demonstrarem especiais aptidões para a função. Os filhos, os sobrinhos, os enteados, as noras, os cunhados, a prima do amigo… e por aí adiante, estão à cabeça da lista de candidatos a qualquer emprego com algum interesse.

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